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     Reconhecido como a última Província do Brasil a aderir à Independência, o Pará tem em sua história movimentos que propugnaram pela causa alguns meses antes da adesão. Um deles, conhecido pelo dia em que ocorreu, completa seu bicentenário neste ano de 2023. O movimento conhecido como 14 de Abril ficou assim registrado pelos documentos do século XIX e pela historiografia como uma das primeiras ações planejadas para proclamar a Independência no Pará. Um de seus escritores, Domingos Antônio Raiol, no primeiro volume dos Motins Políticos (1ª edição em 1865) narrou aquelas tensas horas. Antônio Ladislau Monteiro Baena (1ª edição em 1839), por sua vez, não só escreveu, mas também atuou na reprimenda a movimentação que agitou o amanhecer em Belém.

Figura 1: Painel roda-teto da sala azul - Exposição Sentinela do Norte - destaque para os nomes dos líderes dos motins de 14 de abri de 1823, dentre outros militantes.

roda teto - exposição sentinela do norteFonte: Acervo do Museu-IHGP (2022).

O plano

     Um plano irrompera naquela noite de 13 de abril de 1823. Plano arquitetado dias antes, quiçá meses, ao qual seus partidários aguardavam pela execução numa casa situada na rua do Laranjal, nº 124. Eis que ali aguardavam ansiosos pelo sinal a colocá-lo em prática. Aquela era a casa de João Batista Balbi (nascido em 1792), italiano que havia chegado a Belém em 1819 vindo do Rio de Janeiro e que se tornou um dos defensores da Independência. O plano propunha a adesão das tropas paraenses na capital para a proclamação do novo sistema político no Pará. Com aproximadamente 100 homens provenientes do Esquadrão de Cavalaria e alguns soldados do 2º Regimento, tomariam o Quartel e o Parque de Artilharia, dominando os armamentos.

O bom êxito da primeira ação seria anunciado por dois foguetes artificiais lançados ao ar. Dado o sinal, o resto do Esquadrão da Cavalaria sob o comando do alferes José Mariano de Oliveira Belo se iria reunir ao Segundo Regimento, comandado pelo Capitão Boaventura Ferreira da Silva para marchar juntos a incorporar-se com o Terceiro Regimento. Efetuada esta junção, seguiriam todos para o quartel de artilharia e aí assestariam peças nas embocaduras das ruas do Açougue, de Santo Antônio e dos Mártires por onde poderiam ser agredidos. Esse era o plano.” (RAIOL, Motins Políticos..., 1970, pág. 31).

A ação

     Diante dele, as ações foram seguidas e alguns conseguiram ser realizadas. Entraram no Quartel de Artilharia e deram o sinal esperado. Porém, nem tudo saiu conforme o planejado. Uma delação ao Governador das Armas, José Maria de Moura, por dois soldados do Regimento de Extremoz, fez a contraofensiva se organizar, ainda na madrugada de 14 de abril, para debelar a movimentação. Antônio Ladislau Monteiro Baena, major do Corpo de Artilharia, vivenciou aqueles momentos de perto e no front, como comandante de um Destacamento sob às ordens do Governador das Armas. Considerava os envolvidos com o plano, como um “punhado de revoltosos sectários da Independência” que teriam conseguido desencaminhar parte da Tropa e que naquela noite de 13 de abril iriam fazer iniciar uma “revolução”. (BAENA, 1969, p.374).

     As ações dos partidários foram ainda agravadas pelo incidente ocorrido com o tenente-coronel José Antônio Nunes que era contrário à movimentação e desferiu um tiro contra um soldado e um cavalo do Esquadrão da Cavalaria. Em seguida, foi logo alvejado por vários tiros e levado para conter os ferimentos, mas não resistiu e faleceu dias depois.

     Apesar de saírem às ruas aquela madrugada clamando vivas à Independência e ao Imperador D. Pedro, não obtiveram a adesão dos outros dois Regimentos da Tropa, enfrentaram a desistência de alguns partidários e a reprimenda do Governo das Armas da Província. Um de seus participantes, Ignácio Cerqueira e Silva, descreveu o derradeiro momento:

[...] Imensos vivas à Independência e ao Imperador despertaram a Cidade e o Regimento de Extremoz vergonhosamente traiu a revolução, o que foi o bastante para que o Capitão Boaventura Ferreira da Silva, que então tomou o comando do seu Regimento de Macapá, desanimasse a tal ponto, que conservado no largo de Santo Antônio, ai foi preso sem resistência, logo que ao romper do dia tocou-se a rebate no quartel do 1º Regimento, reunindo-se ali grande número das pessoas, que no escuro da madrugada tinham feito causa comum com os da Independência. (SILVA, 1833, p. 222).

     A acusação contra os participantes do movimento resultou em um intenso debate sobre qual seria o destino dado aos envolvidos. O Governador das Armas sustentava a pena de morte, mas foi vencido pela maioria do Conselho, reunido para deliberar sobre o caso, que ordenou a prisão de 275 indivíduos. Então, no dia 07 de junho, todos foram presos a bordo da charrua Gentil Americana, com o fim de serem transferidos para o Navio Andorinha do Tejo rumo à Lisboa. Alguns envolvidos conseguiram fugir e alguns que foram presos retornaram pouco depois de receberem a notícia que, enfim, o Pará assinara sua Adesão a Independência naquele agosto de 1823.

     Cem anos depois do ocorrido, João de Palma Muniz propôs um reconto do fato histórico em sua tese “A Adhesão do Grão-Pará á Independência” (1923) pela ocasião da efeméride. Muniz destacou, na décima premissa de sua tese que, embora tenha sido o 14 de Abril uma “malograda insurreição” (MUNIZ, 1923, p. 224), por parte do 3º Regimento, não fora, entretanto, uma “covardia”, assim como deixavam entender alguns dos historiadores da época. Segundo Muniz, a atitude de Boaventura da Silva em cruzar os braços diante do ataque, deve ser entendida como um ato heroico por preferir a prisão ao derramamento de sangue de seus compatriotas (Id. Ibid.).     

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Figura 2: Óleo sobre tela :  "Vista panorâmica da baía de Belém", de Leone Righini, 1870 - destaque para o Largo de Santo Antônio.

Righini panoramica Belém

Fonte: Coleção Brasiliana do Acervo  Itaú Cultural (2023).


Referências:

BAENA, Antônio Ladislau Monteiro. Compêndio das Eras da Província do Pará. Belém: Universidade Federal do Pará, 2ª edição, 1969.

HURLEY, Jorge. Belém do Pará sob o domínio portuguez 1616-1823. Belém: Oficinas Gráficas da Livraria Clássica, 1940.

MUNIZ, Palma. A” Adhesão do Grão-Pará á Independência.” In: Revista do Instituto Histórico e Geographico do Pará. Vol. IV. Anos 5 e 6, 1921-1922, fascículo IV, fevereiro-março de 1923. Belém: Oficinas do Instituto Lauro Sodré, 1923.

RAIOL, Domingos Antônio. Motins políticos ou história dos principais acontecimentos políticos da Província do Pará desde o ano de 1821 até 1835. Belém: Universidade Federal do Pará, 2ª edição, vol. I, 1970.

RIGHINI, J. L. "Vista panorâmica da baía de Belém, 1870. Óleo sobre tela. In: Coleção Brasiliana do Acervo Itaú Cultural. Disponível em: https://www.brasilianaiconografica.art.br/obras/18174/vista-panoramica-da-baia-de-belem . Acesso em: 12/04/2023.

SILVA, Ignácio Accioli Cerqueira e. Corografia Paraense, ou descripção física, histórica e política da Província do Gram-Pará. Bahia: Typografia do Diário, 1833.


* Michelle Rose Menezes Barros de Queiroz é discente do Curso de Doutorado - PPHIST-UFPA, tem Mestrado em História Social (UFPA), é docente de História na Escola de Aplicação da UFPA e Sócia Efetiva do IHGP, onde ocupa a Cadeira de Nº 05, patronímica de Antônio Ladislau Monteiro Baena.

** Robson Wander Costa Lopes é discente do Curso de Doutorado - PPHIST-UFPA, tem Mestrado em Ciências da Religião (UEPA), é docente de Filosofia no Instituto Federal do Pará e lotado na Coordenação do Curso de Licenciatura em História IFPA-campus Belém; é Sócio Efetivo do IHGP, onde ocupa a Cadeira Nº 51, patronímica de Eduardo Galvão.


Como citar:

QUEIROZ, Michelle R. M. B; LOPES, Robson W. C. “O 14 de Abril de 1823: um sinal insurrecto da Independência no Pará”. In: Exposição Sentinela do Norte: Debates no Bicentenário (nº 1). Belém: IHGP [website], 2023. Disponível em: https://ihgp.net.br/principal/index.php/9-noticias/276-o-14-de-abril-de-1823-um-sinal-insurrecto-da-independencia-no-para


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